Uma
pipa voando, alta, desperta a minha atenção. Vermelha e branca, com a cauda de
tirinhas de cor indecifrável, dá voltas e mais voltas, cambalhotas, vai para a
esquerda, para a direita, desce, sobe cada vez mais alto, volta a descer a
pique, fica presa na esquina de uma casa em construção, parece que chegou o seu
fim, mas logo o vento e a habilidade de quem a conduz liberta-a e retoma a
velocidade, rasgando o céu de fim de tarde. No horizonte, vários cargueiros azuis
e vermelhos pousados sobre o Oceano que, a esta hora, vai mudando de tonalidade
à medida que o sol desaparece. Alguns veleiros e lanchas passaram velozes há
uns instantes atrás. As ondas rebentam e fazem realçar a espuma branca, lá em
baixo, na areia, onde se percebem silhuetas minúsculas caminhando. Três
palmeiras e um pedacinho bem pequeno, quase simbólico, das ondas brancas e
pretas do calçadão. Do lado esquerdo, o morro do Leme, com a bandeira nacional
em cima do Forte. Lá bem longe, o perfil da Pedra do Elefante (que já tive o
prazer de subir), em Niterói. Um verde exuberante da Mata Atlântica quebrado
pelo laranja das casas de tijolos de Chapéu-Mangueira. Em frente, os prédios brancos
do asfalto, altos, mas não o
suficiente para impedir que contemple toda a imensidão do mar. De algo me tem
de servir 10 minutos de caminhada íngreme morro acima. Só o Hotel Windsor e
outro prédio residencial, um pouco mais à direita, são incorretos nesse
sentido. Mesmo assim, consigo ver todo o Forte de Copacabana, que tem já as
suas luzes amarelas acesas. Uma brisa fresca acaricia-me a pele morena e
relembra-me que estamos no Outono. Outono... essa estação que, na Europa, começa
no fim de Setembro e veste as árvores de cores vermelhas, amareladas, alaranjadas,
para depois as despir, pouco a pouco, deixando no chão um manto de folhas
estaladiças que, sorrio ao lembrar, adorava pisar. Mais casas, mas sem tantos tijolos
laranja à vista, rebocadas com cimento, cinzentas. Uma está até pintada de
branco, outra de verde-água. Os tetos são quase todos de alumínio, ondulados. Imensas
caixas de água azuis por cima das lajes. E mais uma lancha aparece no mar,
deixando um rasto branco por detrás. Um veleiro vai ao seu encontro, a vela
branca, pequena, bem lá ao fundo. Os cargueiros continuam pousados no Oceano,
agora já com as luzes acesas. Parecem mais, até.
Levanto-me
para fechar a janela, essa que me oferece todos os dias o quadro que quis
descrever. Esse quadro valioso, onde cabe o mar, a mata, a favela, o asfalto, o
nascer do sol, a lua, os vizinhos. E reparo que a pipa vermelha e branca, com a
cauda de tirinhas de cor indecifrável, ficou presa no topo da árvore de em
frente.
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